quinta-feira, 26 de novembro de 2015

A casa pode estar zonada, mas o coração está em ordem.

Eu venho de uma família onde sempre foi proibido deixar louça na pia. Sair sem arrumar a cama era motivo de bronca. O foco lá em casa sempre foi organização. Podíamos brincar, espalhar coisas pelo chão, mas depois, tudo tinha que voltar pro seu lugar e a casa tinha que ter aquele ar de limpinha, organizada, impecável. Cada coisa tinha o seu lugar. 
Por um lado, isso nos ajudou a ter responsabilidade nesta convivência num mesmo espaço, tendo consciência de que também éramos parte. Mas por outro, me fez crescer com um leve TOC.
Durante muito tempo me sentia mal quando uma almofada estava fora do lugar, ou se eu tinha que deixar a louça na pia, por estar com pressa, ou até por preguiça mesmo. Ou se a cama estava desarrumada, ou com roupas por guardar. Isso me deixava mal. Muito mal. Parecia que a qualquer momento ia chegar a minha mãe e me dar uma bronca, mesmo eu já tendo a minha casa.
Mas quando fui mãe pela primeira vez comecei a me dar conta de que era praticamente impossível manter tudo sempre em ordem, com aquele pequeno explorador, usando todos os cômodos da casa para brincar, inventar e descobrir o mundo. E com o passar do tempo comecei a me desprender dessa mania de organizar. Me dei conta de que passamos tão pouco tempo juntos, que não vale a pena ficar me preocupando com a simetria dos porta-retratos do aparador. O pouco tempo que temos tem que ser de brincadeira, de conversa, de envolvimento, de aproximação. A roupa, a louça, a casa, tudo isso pode esperar. O Francisco não pode. Ele cresce tão rápido que é muito fácil perder o fio da meada. Eu pisquei, e ele começou a andar. Eu pisquei, e ele começou a falar. Nem me dei conta e um dia ele leu uma frase inteira (neste dia eu chorei). Ele tem as suas questões, seus conflitos, tenho que estar inteira pra dar o apoio que ele precisa. E hoje, com dois filhos, tenho ainda mais urgência em viver tudo com eles. É urgente brincar, pegar no colo, fazer cócegas, dançar, cantar, ouvir como foi o dia, ajudar no tema. É urgente dizer "eu te amo", colocar na cama, ler uma história, ou fazer uma oração antes de dormir. É urgente construir esta parceria, ter tempo pra rolar no chão, brincar de monstro, tomar banho de chuva. É urgente ser mãe. Sempre que volto pra casa no fim do dia, tenho a impressão de que a casa vive zonada. Nunca mais as almofadas ficaram no lugar certo, nunca mais as cortinas ficaram no lugar certo. Sempre tem um brinquedo em algum lugar da casa. Se não é do Francisco, é do Caetano. Tu sempre corre o risco de tropeçar em alguma coisa, sentar em cima de alguma coisa que apita e tomar um susto. Hoje, por exemplo, a pia ficou lotada de louças. A prioridade foi dormir dez minutos a mais e resolver a estrela de Natal (tema de casa do Francisco), que mesmo tendo ficado até quase onze da noite fazendo (Fabricio, eu e ele), não secou direito e precisou de arremates pela manhã. A fitinha de pendurar na árvore não ficou boa, e fui procurar outra fitinha porque o dono da estrela estava preocupado com isso. O Caetano acordou com um sorriso tão lindo, que tive que ficar amassando ele mais tempo do que o normal. O cheirinho dele é inebriante. Eu me transporto para uma outra dimensão quando cheiro aquele pescocinho gordo. Tudo isso é urgente. Então, não tem problema a casa estar zonada, se o coração estiver em ordem.

quinta-feira, 12 de novembro de 2015

Um dia de péssima mãe.

Desde que me tornei mãe tenho aprendido que a culpa é item de série na vida da gente. 
Mãe se culpa por tudo. Quando repreende um filho mais fortemente. Quando não consegue fazer uma refeição equilibrada por falta de tempo e deixa o filho comer qualquer coisa rapidinha de fazer. Quando não consegue contar uma história antes de dormir. Quando esquece de ler a agenda da escola. Quando esquece de comprar o presente de aniversário do amiguinho. Quando não manda suco no lanche. Quando não consegue brincar por que está podre de cansada. Quando deixa escapar um palavrão. Quando levanta a voz. Quando não tem paciência pra responder uma pergunta difícil (ou até uma fácil).
Eu poderia ficar aqui horas listando pequenas, médias e grandes coisas que nos enchem de culpa.
Mas quando eu tive meu segundo filho, proporcionalmente, minha culpa aumentou. Assim como proporcionalmente aumentou a quantidade de coisas para fazer, lembrar, arrumar, organizar, limpar, guardar e carregar. E isso que lá em casa somos super a favor da divisão de tarefas e todo mundo faz de tudo um pouco. Mas a impressão que tenho é que estas tarefas a mais não são compatíveis com minha memória. O pediatra dos guris já diria "viu? foi ser mãe depois de velha!"
E hoje eu tive um daqueles dias em que me senti uma péssima mãe. 
Esqueci da mochila da natação em casa, quando o Francisco adora nadar e o Fabrício já tinha deixado ele de sunga por baixo do uniforme, antes de sair pro trabalho. Morri de culpa por não ter separado os itens pra aula de culinária. Só duas coisinhas, queijo e um chocolate. O Francisco chegou de mãos abanando e eu toda sem jeito fui pedir mil desculpas pra profe, por ter falhado (de novo). 
Mas da mesma forma que me culpo, penso que não deveria pegar tão pesado comigo mesma. Tem tantas outras coisas que dão certo. Não é fácil mesmo conciliar tanta coisa junta. Tem horas que o cérebro dá uma travadinha e isso é normal e totalmente vida real. Aliás, assim como diz na música do Kid Abelha, "as coisas são mais fáceis na televisão". E acho que a gente tem que usar as armas que temos para ir colocando o trem nos trilhos. Usar os lembretes do celular, arrumar tudo na noite anterior, colocar mais responsabilidade no filho, para que ele comece a também ajudar nesta organização e tenha mais responsabilidade quando o assunto envolve as suas tarefas e deveres. Pedir mais ajuda, sem culpa e sem medo de parecer frágil. E até dar uma surtadinha às vezes. Afinal, quem nunca teve um dia difícil, ou se sentiu esgotado. O que não pode faltar nunca é o carinho, o amor, o "eu te amo", o cuidado, o zelo, a verdade em admitir que não somos perfeitos e que, mesmo falhando às vezes, continuamos amando muito e principalmente, tentando acertar.